Rádio Novelo Apresenta 107 | O buraco que cavamos
Como o Brasil virou o país das apostas
Oi, tudo bem?
Nesse momento do ano, é notoriamente difícil pensar em qualquer coisa que não seja férias. Falo por experiência própria: eu e a Paulinha vamos deixar a juventude cuidando da lojinha na semana que vem, e, se me permitem a livre mistura de metáforas, estamos naquela altura do jogo em que o banco de reservas em peso tá de pé, gesticulando furiosamente e proferindo ameaças cada vez mais criativas à integridade física e moral do juiz.
Mas foi num fim de ano desses, com todo mundo olhando para o outro lado (e com muitos de nós provavelmente só pensando em… férias), que a história recente do país deu uma pequena guinada. Foi num momento desses que veio uma decisão que mudou a economia, a política, o esporte, e a vida de muita gente. E o episódio dessa semana tá dedicado a esse buraco – aquele em que a gente se encontra.
Fica o convite, então, não só para ouvir o episódio da semana, mas também para prestar atenção nos terremotos silenciosos que possam estar rolando neste apagar das luzes de 2024. (Façam isso por mim, por favor, porque a partir da semana que vem eu estarei… bom, vocês já sabem.)
Um abraço,
Flora Thomson-DeVeaux
Diretora de pesquisa da Rádio Novelo
No primeiro ato, a Branca Vianna conversa com a Carol Pires sobre os raciocínios tortos e discussões truncadas por trás da liberação das apostas no país. E no segundo ato, a Natália Silva ouve uma pessoa que não foi ouvida lá atrás para entender que buraco é esse em que a gente se meteu.
(O segundo ato desse episódio foi produzido com apoio da Umane, associação civil independente, isenta e sem fins lucrativos, que apoia iniciativas no âmbito da saúde pública com o objetivo de contribuir com um sistema de saúde mais resolutivo e de melhorar a qualidade de vida da população brasileira. Saiba mais sobre a sua atuação acessando umane.org.br)
Branca Vianna,
Presidente da Rádio NoveloHoje eu trago duas dicas bovinas: o documentário Cow, da diretora britânica Andrea Arnold, sobre o que o nome diz mesmo, a vida cotidiana de uma vaca leiteira. O filme tem uma hora e meia e foi filmado em 4 anos. É fascinante e um pouco incômodo, como tudo que a diretora faz. Tem na Mubi. A outra recomendação bovina não é nada incômoda e complementa a apreciação pelas vacas que a gente ganha no filme. É o conto “As Vacas”, da escritora americana Lydia Davis. Em geral ela escreve contos hiper curtos, muitos de duas ou três linhas, mas este sobre as vacas que ela vê da janela da sua casa o ano inteiro, em todas as estações, tem quinze páginas. É um calmante e uma obra prima de observação e descrição. Está num livro chamado Nem Vem, publicado no Brasil pela Cia das Letras. Nos EUA saiu também sozinho, em forma de uma linda plaquete. Inesquecível, penso nele com carinho sempre que vejo uma vaca.
*Ao escolher essa dica da Branca, a newsletteira que vos escreve não poderia deixar de reparar em duas coisas peculiares. Primeiro, esse é o segundo filme sobre vacas, estrelando uma vaca, que nossa presidenta indica nos últimos meses. (Ganha uma estrelinha dourada quem lembrar do último filme bovino indicado por aqui, e duas estrelinhas douradas quem tiver assistido aos dois.) A segunda coisa é que a Branca não diz que quem traduziu Nem Vem, essa coletânea da Lydia Davis com o conto “As Vacas”, foi ela mesma! Não tive outra opção se não acabar com essa modéstia toda.
Quando o Paulo Azevedo pôs play no Apresenta da semana passada, ele reparou numa “coincidência” entre o noticiário daquele dia e a data de estreia do episódio: “exatamente HOJE está tendo operação da PM na Maré. De 2019 pra cá, infelizmente, nada mudou”. Mais uma semana com operação policial, mais uma operação com vítimas fatais, e mais uma operação em que várias escolas tiveram que fechar. Em meio a tudo isso, muitos ouvintes se emocionaram com as vozes de crianças da Maré e com a história da Bruna, da Maria Vitória, e do Marcus Vinícius – e não faltou torcida para que a Vitória realize o sonho de virar perita criminal.
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Não sei se aqui é o melhor lugar, mas queria fazer um comentário sobre esse episódio. Ele foi muito bom e importante em diversos aspectos, mas acredito que houve uma confusão em alguns momentos. Várias vezes confundem e misturam as apostas esportivas com os cassinos online. Essa confusão é bem comum, até porque vários sites operam as duas coisas e muitas vezes não fazem questão de diferenciar nas propagandas. Mas tanto são diferentes que nem foram liberados ao mesmo tempo. Naquela portaria do governo Temer foram liberadas apenas as apostas esportivas, os cassinos online foram liberados algum tempo depois, já no governo Bolsonaro se não estou enganado.
Embora ambos tenham um potencial de vício bastante alto, eu diria que os cassinos online são muito mais perigosos que as apostas esportivas por um simples motivo: a possibilidade de o próprio jogador e o povo como um todo "auditar" o resultado. No caso das apostas esportivas, o resultado é baseado em algo que acontece fisicamente, uma disputa entre times, que todo mundo pode ver e saber como aconteceu (claro que temos os escândalos de manipulação, mas isso é outra história, e só de descobrirem esses escândalos já mostra que é de alguma forma um pouco mais seguro). Enquanto isso, nos cassinos online, os famosos "tigrinhos", os resultados ficam completamente escondidos atrás de um código digital que não passa por fiscalização, o que deixa o ganhar ou perder dos jogadores completamente nas mãos da banca.
Enfim, ambos são complexos e problemáticos, mas reparei que algumas vezes no podcast houve uma mistura dos dois, falavam termos relacionados a um e ao outro nas mesmas frases, causando alguma confusão.